O anúncio do Governo de Moçambique de premiar com 10% da multa aplicada quem denunciar produtores de bebidas alcoólicas de alto teor — vulgarmente conhecidas por xivotxongua — abre um novo capítulo no combate à produção e consumo destas substâncias que proliferam sobretudo nos bairros periféricos. A medida, apresentada esta sexta-feira (05) pelo porta-voz do Conselho de Ministros, Inocêncio Impissa, em Maputo, surge como estratégia para travar um fenómeno considerado de risco à saúde pública.
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Mais do que a repressão directa, o Executivo aposta na mobilização dos próprios cidadãos, que passam a ser parte activa da fiscalização. Cada denúncia confirmada dá ao denunciante direito a uma recompensa de 10% sobre o valor da multa aplicada ao transgressor. É, no fundo, uma transformação da comunidade em extensão das forças de inspecção do Estado.
No entanto, o incentivo financeiro levanta interrogações sérias. Num país marcado pela precariedade económica e pela luta diária pela sobrevivência, a recompensa pode funcionar como isco irresistível para transformar vizinhos em potenciais “delatores profissionais”. O risco de denúncias falsas, ajustes de contas pessoais e perseguições disfarçadas de zelo cívico é real e coloca em causa a fronteira entre justiça e vingança.
O xivotxongua, produzido muitas vezes em quintais e comercializado em garrafas recicladas, é apontado como responsável por mortes súbitas, casos de cegueira, violência doméstica e acidentes rodoviários. Apesar disso, continua a ser uma fonte de rendimento para centenas de famílias que, sem alternativas de sustento, recorrem à sua produção clandestina. A decisão governamental coloca, assim, em rota de colisão o combate à saúde pública e a luta pela sobrevivência económica das comunidades.
O discurso oficial insiste na necessidade de cortar pela raiz este “negócio envenenado”, mas nos corredores da sociedade civil levanta-se outra dúvida: não estará o Estado a transferir para cidadãos comuns uma responsabilidade que deveria ser garantida por mecanismos sólidos de fiscalização?
Ao colocar um prémio em dinheiro sobre a denúncia, o Governo cria uma nova dinâmica social, onde a solidariedade comunitária pode ser minada pela suspeita e pelo medo. Na prática, abre-se espaço para uma economia paralela da delação, onde a lei deixa de ser apenas instrumento de ordem e passa a ser fonte de renda.
Entre a promessa de um país livre de bebidas clandestinas e o risco de uma sociedade fragmentada pela desconfiança, a batalha contra o xivotxongua entra agora numa fase decisiva — com os cidadãos no centro do tabuleiro, entre a saúde pública e o prémio de 10%.
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