Na semana passada, a Comissão Política da FRELIMO reuniu-se para a sua 48.ª sessão ordinária. No papel, o encontro visava “avaliar a marcha do país”, escutar o pulsar do povo, e orientar a governação rumo ao bem-estar colectivo. Na prática, porém, assistimos a mais uma encenação política, fiel ao velho guião de autoelogio partidário.
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Sob a batuta do recém-entronizado Presidente da FRELIMO e da República, Daniel Chapo, o partido no poder voltou a oferecer ao povo moçambicano um banquete de palavras, recheadas de promessas, pinceladas de patriotismo institucional e a velha ilusão de que estamos no caminho certo. Mas a pergunta que se impõe: certo para quem?
Falam da prorrogação do IVA como se a fosse salvação. Mas que impacto tem essa medida num mercado onde a economia informal dita as regras e os preços? O sabão continua caro, o açúcar é artigo de luxo em muitas casas, e o óleo alimentar virou produto racionado nos lares de baixa renda. O IVA pode estar isento na lei, mas a fome não se isenta nas panelas vazias.
Falam da redução das portagens como prova de sensibilidade social. Mas não dizem quem paga a diferença. Não dizem que os contractos com as concessionárias privadas permanecem intocáveis, garantidos com fundos públicos. Quem, afinal, está a beneficiar? Os automobilistas urbanos de Maputo ou os camponeses do Gurué que não sabem o que é uma portagem?
Enchem a boca com a “aplicação da Lei do Diálogo Nacional Inclusivo”. Mas alguém já viu esse diálogo a acontecer nas zonas de conflito em Cabo Delgado? Alguém consultou os partidos extraparlamentares? E os activistas perseguidos, os jornalistas silenciados, os cidadãos detidos por ousarem protestar pacificamente?
Falam da Tocha da Unidade Nacional como símbolo de moçambicanidade. Mas esquecem que, enquanto a tocha corre as estradas em festivais pagos pelo erário público, a nação continua fracturada socialmente, economicamente e geograficamente. Em Inhassunge, por exemplo, o povo espera há anos por uma simples ponte para atravessar um rio. Isso também é moçambicanidade, ou apenas a periferia que não cabe nas fotos?
E quanto à diplomacia presidencial, a mesma que posa para retratos com líderes estrangeiros e sela acordos com o FMI, que frutos concretos colheu o cidadão comum? O desempregado de Quelimane, o pescador de Pebane, o enfermeiro de Chibuto, a mãe solteira do bairro de Namicopo, todos continuam de fora deste teatro de vitórias imaginárias.
O pior, porém, não é o conteúdo, é o silêncio cúmplice da bancada parlamentar da FRELIMO, apresentada como “fiscalizadora activa” da governação. Fiscalizadora? De quê? Quantas interpelações reais foram feitas? Quantas vezes se opuseram às decisões do Executivo? Ou será que fiscalizar, na nova gramática política da FRELIMO, significa apenas aplaudir com mais força?
Quando a governação se transforma numa máquina de propaganda, o país perde o rumo. E quando a crítica é confundida com sabotagem, o futuro deixa de ser construção colectiva para se tornar propriedade privada de um partido.
Estamos num país onde o poder fala muito mas muito mesmo, mas escuta pouco. Onde se produz narrativa em série e se ignora o sofrimento quotidiano do cidadão. O povo já não come discursos, nem vive de decretos. Quer justiça social, dignidade, pão na mesa e sobretudo verdade.
A continuar assim, a governação torna-se um espectáculo de sombras, encenado por elites para uma audiência cansada, que cada vez mais olha para fora do palco em busca de sentido.
E se há algo que a história nos ensina, mesmo quando tentam reescrevê-la, é que nenhum regime sobrevive eternamente ao seu próprio silêncio.
Zito do Rosário Ossumane
Jornalista e activista político
Coluna “Artigo 51” – Porque o povo tem direito ao contraditório
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