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As incoerências e incongruências da Chama da Unidade

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Por: Entre o Pode e o Povo – James Njiji

Depois de seguir através das redes sociais  e  médias, o lançamento e percurso da “chama da unidade”, cheguei a conclusão já existente de que, Moçambique  está ancorado na selva do mar. Num momento em que clama por justiça, verdade e reconciliação genuína, depois de eleições fraudulentas, que mais pareciam um filme  de  terror mal produzido com urnas que se enchiam quase sozinhas, editais que aprendiam a  desaparecer e se corrigir, com a polícias que,  em vez  de  proteger,  espancavam  fiscais, delegados dos Partidos políticos, observadores impedidos de observar.

Em meio disso tudo, o Presidente da República, aconselhado por seus partidários sem o Povo que ele alega  o  terem  escolhido  e confiado, num rasgo de criatividade que se pretende ser nacionalista, decidiu acender… a Chama, sim a “Chama da Unidade”! Unidade de quem?

A pergunta, “Unidade de Quem” surge porque, o cenário não podia ser mais inspirador; um País em luto, vidas perdidas nas ruas,  manifestações  que eles apelidaram de “ilegais e violentas”, mas o Povo estava a  busca  da justiça eleitoral. Famílias foram devastadas, cidades e vilas como Matola,  Morrumbala, Alto Molócue, Nampula, Namacurra e outras, ainda choram e continuam com feridas de balas direcionadas ou “perdidas” que ainda sangram, olhos que ainda lacrimejam do gás comprado por dinheiro dos seus impostos. Quando se esperava algo melhor, eis que surge o grande símbolo da reconciliação. Uma tocha rodeada de blindados, polícias encapuçados, (sem rosto e acho sem alma), e um silêncio ensurdecedor de quem devia estar a falar, a pedir desculpas, para ver se pode governar o Povo com o Povo.

O mais interessante, a tal chama foi lançada em Cabo Delgado, região que já conhece fogo suficiente – real e  não  simbólico, não é isto incongruente? Agora com pompa e circunstância, carregado  de 30 milhões  de meticais, vai  percorrer o país até Maputo, a tempo de abrilhantar o 25 de Junho festa dos 50 anos da má governação, um jubileu sem júbilo.

A viagem da  chama pelo Moçambique  me parece, uma espécie de tour espiritual, com direito a crateras  nas  estradas  nacionais  e  regionais, aplausos ensaiados e lágrimas programadas. Uma chama, diga-se, que a meu ver deve estar equipada com GPS e escolta presidencial, força aérea e blindados, polícia e militares das unidades especializadas, num acto de guerra, foi a forma encontrada para garantir a sua trajectória até ao destino, pois sem isso, duvido que não sobreviveria à realidade do país que supostamente representa.

Sua  essência se  revela  porque enquanto desce a caminho da capital do poder forçado e imposto, nas margens do  percurso iluminado da unidade, o povo continua a ser raptado,  detido, baleado por pensar diferente do regime como   recentemente vimos o sucedido ao Joel Amaral, que  foi  alvejado para  ser  silenciado. Mas nada disso importa para quem governa a força mesmo que seja contra vontade popular, temos uma chama! Que sorte a nossa. Sim sorte de termos espetáculo de luz para esconder a escuridão; um símbolo da chama para queimar e enterrar a verdade.

O mais poético de tudo, é que o  realizador do filme, fala em reconciliação, mas sem uma única palavra sobre os mortos da repressão, os presos políticos, os tribunais manipulados ou a Constituição rasgada. Ele fala de unidade enquanto a máquina do Estado se dedica à arte de dividir, oprimir e humilhar. Um discurso de paz num país onde pensar diferente é quase um crime de guerra.

Os Ministros  respondem  ironicamente  aos parceiros da imprensa, vimos isso quando o Ministro da Saúde e o de Interior quando foram indagados sobre as graves do médicos e enfermeiros assim com sobre os esquadrões de morte respectivamente.

Ao acender a  chama  copiando a iniciativa do Ex. Presidente Guebuza que a fez renascer dos escombros do museu, devia ter procurado o verdadeiro “script”, porque tal chama que deveria simbolizar esperança virou uma metáfora viva das contradições do regime.

É uma chama “pante” acesa com petróleo de cinismo, por  onde  passa está protegida por escudos de medo, e conduzida por mãos que  não conhecem a verdade nem a justiça, os mesmos que semearam terror nas manifestações e continuam  sequestrando e baleando o Povo que clama pela justiça, pela boa governação que não tem a mais de 10 décadas. Como podem ser os transportadores da unidade?

Sim, claro. Carregado de incongruências e incoerências a “Chama da Unidade” é a unidade só entre os que se impõe para governar. Nós, os outros que se calem, ou que se queimem com a chama que não aquece, não guia, nem ilumina nada além da arrogância do forçado.

É incongruente  celebrar  a  paz enquanto  se pratica a violência  de Estado. A chama da unidade não pode ser apenas um espetáculo político, ou é alimentada com a verdade, ou se torna um incêndio de hipocrisia.

O povo moçambicano está precisando de  algo  diferente,  algo que lhes possa devolver a dignidade de ser cidadão com direitos e deveres, não precisa de fogos simbólicos nem de roteiros  encenados  em  nome  da  unidade.  Precisa de justiça,  liberdade, reconciliação autêntica e líderes que falem e ajam em uníssono com os princípios que proclamam.

Enquanto  houver  essa  distância  entre  discurso  e  prática, a “chama da unidade” será apenas mais uma chama falsa acesa para encobrir as trevas de governação do regime no poder que quase lá vão 50 anos empobrecendo o  povo outrora proclamado “seu patrão” por um Ex. estadista deste país. Que fique claro que: com tal chama, o POVO não vê luz muito menos a Unidade, mas sim vê ameaças e medo, vê o fogo que queima e transforma em cinza a verdade e a esperança.


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