Dondo, Sofala – Na manhã pascal deste domingo, o Presidente da República, Daniel Chapo participou, com visível emoção, na missa da Ressurreição, celebrada na Paróquia Santa Ana, em Dondo, província de Sofala, a mesma onde foi baptizado e crismado. Num registo mais pastoral do que presidencial, Chapo apelou à reconciliação, ao amor e à comunhão entre moçambicanos como antídotos contra o ódio e a violência que, nas suas palavras, “não desenvolvem a ninguém”.
Ao lado da esposa, a Primeira-Dama Gueta Selemane Chapo, o Chefe de Estado resgatou memórias da infância e evocou o valor da fé cristã no seu percurso pessoal, utilizando o púlpito como tribuna política, numa tentativa de construir uma ponte entre a espiritualidade e governação. No seu estilo cada vez mais litúrgico, Chapo disse estar de regresso “à casa” e à “família em Cristo”, lembrando que “um bom filho volta a casa”.
Mas entre o afecto da comunidade e os cânticos da missa, o Presidente não perdeu a oportunidade para abordar temas sensíveis da actualidade política. Justificou a sua ausência de visitas anteriores àquela comunidade com o contexto “intenso” do pós-eleições de 2024, marcado, nas suas palavras, por episódios de violência e destruição. Foi uma admissão velada da instabilidade que se seguiu à sua tomada de posse, e que ainda persiste por várias partes do país.
“A violência gera violência. O ódio gera ódio. É importante que cultivemos o amor”, declarou o Presidente, numa retórica que se quis reconfortante, mas que também deixa transparecer a fragilidade das promessas de estabilidade e inclusão.
Num estilo que mistura salmos com discurso de Estado, Chapo citou versículos bíblicos para reiterar que o seu governo se inspira em valores cristãos: “Deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz, amai-vos uns aos outros.” Segundo afirmou, este princípio norteou os encontros com partidos e candidatos derrotados nas últimas eleições, um esforço que, apesar de anunciado, ainda carece de resultados tangíveis e de gestos mais inclusivos.
A homilia de Chapo teve ainda espaço para um apelo genérico à unidade nacional, num registo de “do Rovuma ao Maputo, do Zumbo ao Índico”, incluindo a diáspora, em que agradeceu ao povo pelos “esforços colectivos” em prol da paz. Contudo, não deixou pistas concretas sobre como pretende lidar com os clamores de reforma política, descentralização efectiva e justiça social, que continuam em várias latitudes do país.
O regresso à Paróquia Santa Ana, se por um lado teve a intenção de humanizar o Presidente e reforçar as suas raízes humildes, por outro revelou a tentativa de reforçar a sua autoridade moral num momento em que o seu capital político ainda está a ser testado, quer dentro do partido que o elegeu, quer fora dele, num ambiente social marcado por desconfiança e exigências de respostas concretas.
Num país onde a liturgia da reconciliação já serviu para silenciar dissidências e camuflar desigualdades, o desafio de Daniel Chapo será transformar palavras em actos e espiritualidade em política pública. Porque, como bem se sabe, nem só de homilias se faz um país.
Discover more from Jornal Txopela
Subscribe to get the latest posts sent to your email.