Excelentíssimos compatriotas, ilustres defensores da pátria, irmãos de luta e da esperança,
É com o peso da inquietação e a gravidade dos tempos que nos rodeiam que me dirijo a vós nesta hora de incerteza, onde o espectro do caos paira sobre a nossa amada pátria. Venâncio, numa locução firme e carregada de convicção, anunciou para segunda-feira, dia 20, o início de uma greve nacional geral. Às zero horas, as rodas do país cessarão o seu giro, com a paralisação de toda e qualquer actividade pública ou privada. Eis o que prometeu. E, ao assim o fazer, afirma que é a resposta ao clamor do seu eleitorado, após as contestadas eleições de 9 de outubro e as crescentes acusações de fraude, lançadas por todos os partidos da oposição e respaldadas pelos observadores, nacionais e estrangeiros.
Ora, uma manifestação de tamanha envergadura, com tais propósitos, não é isenta de consequências. Grave será, ao meu ver, e com desdobramentos imprevisíveis.
Moçambique, nas últimas décadas, está submerso num mar de descontentamento social. As crises económicas agudizam-se; a corrupção, por todos conhecida, alastra-se como uma chaga sobre o tecido nacional. O pão na mesa do cidadão comum escasseia, e a juventude – principalmente nas zonas urbanas – há muito perdeu a fé nos mecanismos democráticos. As recentes eleições autárquicas não trouxeram o alívio que se esperava. Os jovens, os pilares da nossa nação, acreditam agora que a democracia, tal como a conhecemos, não resolve mais os seus problemas. Quem de entre nós ousará contradizê-los?
Nessa arena de desalento e miséria, crer que uma manifestação de tal envergadura não se transfigure num golpe popular é pura ingenuidade. A História não nos ilude: os sinais estão por toda parte, e os precedentes, não tão distantes.
Os sectores nevrálgicos do nosso Estado – os professores, enfermeiros, policiais, magistrados, procuradores e juízes – todos partilham do mesmo descontentamento. Até o silêncio das nossas forças armadas, outrora característico, foi interrompido por murmúrios de insatisfação. Não podemos ignorar tal realidade, pois o sopro da mudança nunca é uma brisa suave; é uma tempestade que se forma lenta, mas inevitável.
Recordo-me de novembro de 2017. No Zimbábue, quando Robert Mugabe tentou assegurar o poder à sua esposa, Grace Mugabe, foi o exército que, com apoio popular, o depôs. Quem fala do Zimbábue, fala também do Egito, onde Hosni Mubarak, após 30 anos de um regime de repressão, corrupção e pobreza, caiu diante do ímpeto de um povo cansado. E o que dizer dos nossos irmãos africanos? Níger, Burkina Faso, Guiné, Chade, Mali, Sudão, Gabão. O golpe de Estado tornou-se um refrão conhecido em todo o continente.
A semelhança é inevitável. Crises profundas de governação, corrupção desenfreada, insegurança generalizada e um terrorismo que ameaça a paz de todos. Em cada um desses cenários, o desespero do povo encontrou nas armas uma solução. E em Moçambique? Poderemos evitar um desfecho semelhante?
Minhas senhoras e meus senhores, o povo é o verdadeiro soberano. Quando o grito da rua ecoa e as urnas parecem incapazes de escutar, quando o Estado vira as costas ao clamor dos seus filhos, o desespero substitui a esperança. E o que pode evitar o desespero senão uma mão firme que devolva a dignidade ao povo?
Que estejamos todos cientes do que se avizinha. Um golpe popular, quem poderá evitar?
Por: Zito do Rosário Ossumane