Nampula – Em tempos de desconfiança generalizada na capacidade dos serviços públicos de saúde, eis uma história que brilha, literalmente, nos corredores do Hospital Central de Nampula (HCN). Seis pacientes que haviam mergulhado no escuro absoluto devido à catarata bilateral voltaram a ver o mundo, graças a uma campanha cirúrgica de cinco dias promovida pelo departamento de oftalmologia da unidade sanitária.
Entre segunda e sexta-feira, a campanha atendeu 113 pacientes, dos 120 inicialmente previstos. O número, embora ligeiramente abaixo da meta, não ofuscou os resultados clínicos e emocionais. “Pelo menos seis pessoas que não viam absolutamente nada voltaram a enxergar. Isso, para nós, já é um enorme sucesso”, desabafou Sofia Nacibo, médica residente em oftalmologia, visivelmente tocada com o impacto humano da acção.
O primeiro dia foi marcado por dificuldades de acesso, sobretudo para pacientes oriundos de distritos periféricos. Segundo Nacibo, as condições climatéricas adversas comprometeram o transporte de utentes, influenciando directamente no número final de atendimentos. Ainda assim, a avaliação geral é de “missão cumprida”.
A campanha foi realizada com o apoio da organização Sightsavers, parceira antiga do HCN na luta contra a cegueira evitável. Para além das cirurgias pontuais, a unidade hospitalar oferece consultas regulares e cirurgias electivas de forma gratuita, um alívio para muitos moçambicanos que, entre a fome e a farmácia, são obrigados a escolher.
A médica deixou um alerta sério: “Muitos chegam até nós quando já é tarde demais. A automedicação está a destruir olhos que podiam ser salvos com uma simples gota no momento certo”, afirmou Nacibo, apelando ao público para que procure assistência ao primeiro sinal de problema ocular.
Num país onde a saúde pública é tantas vezes sinónimo de filas intermináveis, diagnósticos por adivinhação e frustração crónica, histórias como estas mostram que quando há vontade, organização e profissionalismo, a transformação é possível. Os seis pacientes que voltaram a ver são testemunhos vivos e agora também visuais de que o Estado ainda pode fazer a diferença, mesmo com poucos meios.
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