Por Zito do Rosario Ossumane
Desde a tenra infância, gravei na memória a sábia advertência de minha mãe, Dona Helena Dulce João do Rosário Braz, enfermeira de préstimos incontáveis: “Nunca teste a profundidade do rio com os dois pés.” Tal máxima encerra um princípio elementar de prudência, recomendação que nos impõe a cautela antes de qualquer arrojo. Mas, ao que tudo indica, tal preceito foi ignorado no Conselho Municipal de Quelimane, que, num ímpeto de desatino, resolveu impor à cidade uma carga fiscal insuportável, num gesto que desafia a lógica e o bom senso.
Nesta semana, através das redes sociais e devidamente reportado neste semanário na sua versão diaria no digital (www.txopela.com), despoletou-se um debate imprescindível acerca da escandalosa majoração dos emolumentos administrativos na edilidade. O povo, com justa razão, interroga-se: Como pode uma singela declaração de bairro, estampada num modesto papel A4, custar mais do que um Bilhete de Identidade, produzido com tecnologia sofisticada?
Outros, mergulhados na perplexidade, lançam uma questão ainda mais inquietante: Para onde fugiremos? O governo sufoca-nos e a oposição também?
No termo do debate, há quem qualifique o aumento em mais de 310% das taxas municipais como um roubo descarado do bolso do cidadão. Outros preferem considerá-lo uma brincadeira de gosto duvidoso. Mas uma certeza prevalece: o povo está indignado. E indignado com razão. Afinal, não há explicação plausível para agravar ainda mais a vida dos munícipes quando a cidade está submersa, afogada em águas pluviais, enquanto a governação municipal patina sem rumo, errante como barco sem leme.
A edilidade de Quelimane, sob o comando de Manuel de Araújo, posiciona-se de maneira desastrosa neste imbróglio. O que se vê é um gesto de ingratidão a uma população que, num passado não distante, se sacrificou na luta por uma governação autárquica diferente, marchando incessantemente por 44 dias e afrontando um regime que lhes usurpava o direito de escolha.
Ora, ouvi atentamente a justificação do edil quando este se dirigiu à imprensa. Disse ele, num tom professoral: “Todos devemos contribuir para a cidade.” Ademais, reconheceu que errou ao não proceder a um aumento paulatino das taxas, como se o problema se resumisse apenas ao modo como se serviu a amarga poção e não à sua própria natureza.
E eu concordo, errou. Mas errou ainda mais ao esquecer que há sectores na cidade que permanecem imaculados de qualquer tributação, como os taxistas, cujo labor, certamente, poderia render dividendos consideráveis à autarquia, caso fossem inseridos na estrutura contributiva.
Aqui não se trata apenas de uma questão numérica, de um cálculo frio que justifique, sob o manto das tecnicidades orçamentais, a desgraça do povo. Trata-se de justiça! A cidade não precisa de justificações anódinas, incapazes de convencer até mesmo o mais desatento dos cidadãos.
O que se espera, o que se exige, é um recuo imediato, um acto de humildade que restaure a confiança entre governantes e governados. O caminho certo não é forjar desculpas esfarrapadas, mas sim revogar esta decisão nefasta e escutar a voz de quem, um dia, depositou confiança no actual elenco municipal.
Os quelimanenses não podem, nem devem, resignar-se diante de uma carga tributária absurda e aviltante. Isto não é um mero erro de gestão. Isto é um atentado à dignidade do povo!
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