A Frelimo e o ANC, ambos antigos movimentos de libertação, têm a difícil missão de provar, nas eleições que se avizinham (9 de Outubro, em Moçambique, e 29 de Maio, na África do Sul) de que ainda merecem credibilidade e confiança dos seus povos para continuarem a governar, apesar  de se terem tornado partidos impopulares por conta da degradação da qualidade de vida dos moçambicanos e sul-africanos.

As duas formações políticas, em momentos de crise, vão aos sufrágios com muitos pecados que, no fundo, serão os seus principais adversários políticos nas urnas. O primeiro é o facto de terem abandonado os seus princípios e valores que nortearam a sua fundação. O mais grave ainda é que se distanciaram, por completo, dos seus povos.

Quer a Frelimo, quer o ANC estão numa crise de identidade. A Frelimo, depois da ideologia marxista-leninista, abraçou o capitalismo selvagem e hoje, quando falamos da Frelimo, ninguém mais sabe de que partido se trata: Se é da esquerda ou da direita ou se é centro-esquerda ou centro-direita. O mesmo acontece com o ANC.

Os seus dirigentes estão mais preocupados em servirem-se a si próprios do que ao povo. Tornaram-se arrogantes e autoritários. Pisam ou humilham pessoas à sua volta. Proferem discursos indecentes que ofendem os governados.

Da lista dos pecados que recaem sobre a Frelimo e o ANC consta o acentuado custo de vida, as desigualdades sociais, as assimetrias regionais, o desemprego, problemas de habitação e falta de oportunidades para a juventude, altos índices de criminalidade e tráfico de drogas envolvendo nomenclaturas políticas e não só.

No caso particular de Moçambique, há o caso do dossier sobre horas extras que o governo não consegue resolver, atrasos sistemáticos no pagamento dos salários aos funcionários públicos. Hoje já não há data fixa para o efeito. Há cadernos reivindicativos não respondidos, até agora, pelo governo, como são os casos de profissionais de saúde e médicos. Estes são outros pecados não menos importantes.

Na África do Sul, há, ainda, queixas sobre baixa qualidade na gestão e prestação de serviços públicos, nomeadamente os apagões contínuos de energia eléctrica resultantes da crise energética que assola, nos últimos tempos, aquele país vizinho.

Os governos moçambicano e sul-africano não conseguem, igualmente, providenciar o emprego para os jovens. A Frelimo, nas eleições gerais de 2019, prometeu criar três milhões de empregos, promessa que não foi cumprida. Cerca de 56,8 por cento da população jovem, avaliada em 33,4 por cento dos 30 milhões de moçambicanos, está no desemprego.

Na África do Sul, estamos a falar de mais de 60 por cento dos jovens entre os 15 e os 24 anos que estão sem ocupação.

O outro assunto comum nos dois países, que contribui significativamente para a impopularidade da Frelimo e do ANC, é a corrupção. Em Moçambique, temos o caso emblemático do calote de 2.2 mil milhões de dólares, dívida contratada ilegalmente em bancos russo e suíço, com o envolvimento de alguns quadros seniores da segurança do Estado, da Presidência da República e do partido Frelimo.

Tornou-se uma prática corrente dentro do partido alguns membros e simpatizantes comprarem consciências das pessoas em caso de eleições internas para garantir a sua escolha para os diferentes órgãos do partido.

No país, a corrupção tornou-se uma forma de ser e estar nas instituições públicas e privadas em que para que o seu expediente possa ser tramitado com celeridade é preciso pagar. O crime envolve, inclusive, agentes da polícia, juízes e magistrados que deviam ser a reserva moral da sociedade.

O cenário é similar na África do Sul. O ANC tem estado a ser sacudido com casos de corrupção implicando membros da direcção do partido. Em 2023, o seu secretário-geral, o ACE Magashule, foi expulso por fraude, corrupção e lavagem de dinheiro num projecto de cerca de 14,5 milhões de euros, mais de 255 milhões de randes.

Enquanto isto, o antigo Presidente da África do Sul e do ANC, Jacob Zuma, foi acusado, igualmente, de fraude, corrupção, lavagem de dinheiro e extorsão, num caso judicial de mais de 20 anos, relacionado com a compra de equipamento militar a cinco empresas europeias de armamento em 1999, quando era vice-presidente do país.

O próprio presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, foi acusado, em 2020, de acumular quantias elevadas de dinheiro na sua quinta de caça Phala Phala. É que foram roubados neste local, a 9 de Fevereiro, 4 milhões de randes, valor que o dirigente do ANC não soube explicar sobre a sua proveniência.

Como consequência dos problemas que se levantam, quer em Moçambique, quer na África do Sul, crescem, a cada dia, os níveis de insatisfação popular resultando no declínio da popularidade da Frelimo e do ANC. A sua imagem está corrompida ao serem responsabilizados pelos erros de governação dos seus países.

Enquanto em Moçambique algumas vozes se levantam, dizendo que estão cansadas de serem governadas pela Frelimo, no poder há 49 anos, na África do Sul, as últimas sondagens mostram que dado à sua impopularidade, o ANC poderá, pela primeira vez, não alcançar a maioria nas eleições deste mês.

Dados divulgados pela Fundação de Pesquisa Social (FPS) indicam que o apoio ao ANC caiu de 52 por cento para 45 por cento. Por sua vez, a pesquisa de IPSOS sugere uma queda maior para 43 por cento, o que é grave.

Estes sinais de saturação não são de desprezar. Levam a crer que alguma coisa não está bem. Que os dois antigos movimentos de libertação têm de melhorar a sua governação, sob risco de perderem totalmente a confiança dos eleitores. (X)

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